Introdução
Entre 30 de setembro e 2 de outubro, Madrid acolheu a 17ª edição do Fruit Attraction, consolidando-se como um dos principais pontos de encontro internacionais para o setor hortofrutícola. A feira reuniu produtores, distribuidores, retalhistas e profissionais de toda a cadeia de valor, criando um espaço fundamental para identificar oportunidades de crescimento, fortalecer alianças e antecipar tendências de mercado.
Nesta edição, a Fruit Attraction contou com a participação de 2.460 empresas expositoras de 64 países, o que reflete o seu carácter global. Do total, 52% correspondeu à participação nacional, com representação de todas as comunidades autónomas produtoras de frutas e hortícolas, reforçando assim a liderança de Espanha no setor hortofrutícola.
O tomate, designado como produto estrela, foi o centro de inúmeras atividades – desde showcookings até palestras e espaços de debate sobre o seu valor nutricional, a sua versatilidade culinária e o seu papel no comércio internacional. Este enfoque temático serviu como fio condutor para abordar questões de inovação varietal, sustentabilidade e posicionamento do produto, numa edição especialmente orientada para conectar a técnica com a experiência do consumidor.
Com um forte ênfase na inovação, qualidade, comercialização e conhecimento, a Fruit Attraction 2025 reafirmou o seu papel como plataforma estratégica para a promoção internacional, impulsionando tanto a atividade comercial como a profissionalização do setor.
A marca como alavanca estratégica: competir para lá do produto
A categoria de frutas e hortaliças está a atravessar um ponto de viragem. Embora continue ligada à sua origem agrícola e tradicionalmente definida por atributos funcionais – frescura, sazonalidade, origem – hoje está plenamente integrada nas dinâmicas do grande consumo. A ampliação da sua presença no retalho moderno, a consolidação do consumo diário e a profissionalização da embalagem e da comunicação criaram um contexto competitivo diferente: os frescos já não se distinguem apenas pela sua qualidade intrínseca, mas também pela sua capacidade de gerar valor percebido, construir marca e conectar-se com o consumidor.
Na ausência de marcas sólidas e posicionamentos definidos, grande parte da oferta continua a ser percebida como um produto mainstream ou mesmo como uma commodity: altamente substituível, fracamente identificado e condicionado pela variável preço. Esta dinâmica limita o potencial de crescimento e dificulta a criação de vantagens sustentáveis, pelo que o grande desafio para os operadores consiste em evoluir de uma lógica de produto indiferenciado para uma gestão estratégica orientada para a criação de marca e valor.
A edição Fruit Attraction 2025 destacou esta transição. Enquanto uma parte significativa dos expositores manteve um foco tradicional – centrado em atributos funcionais e numa estética homogénea associada à natureza – algumas empresas avançaram decididamente para uma lógica competitiva mais próxima das categorias maduras do grande consumo: construção de marca, diferenciação simbólica e ativação de experiências relevantes.
O BCC – Grupo Cajamar articulou a sua posição como agente estrutural do ecossistema agrícola através de uma instalação icónica: uma grande caixa azul que simbolizava a sua proposta de valor.
A Moyca quebrou com os códigos visuais convencionais através de um stand monocromático magenta – a sua cor corporativa – projetando uma imagem contemporânea e reconhecível.
A Guerrero Fresh reinterpretou a experiência da marca com um espaço inspirado num café parisiense, introduzindo códigos de sofisticação, elegância e proximidade pouco comuns na categoria.
A proposta mais relevante foi a da Cuna de Platero, que, sob o lema “A nossa fruta, uma obra-prima”, transformou o seu stand numa galeria de arte onde as frutas vermelhas eram apresentadas como peças únicas. Através da inteligência artificial e projeções digitais, a marca construiu uma narrativa estética e cultural que transcendia o funcional, elevando a fruta ao plano simbólico e sensorial.
Para além do impacto visual, estas propostas antecipam o futuro da categoria. Num contexto cada vez mais saturado de mensagens sobre sustentabilidade e frescura, a vantagem competitiva já não reside unicamente no produto, mas sim na capacidade de construir uma proposta de marca distintiva, aspiracional e coerente.
Se as frutas e os legumes já competem segundo as regras do grande consumo, devem ser geridos estrategicamente como tal. Isso implica desenvolver marcas fortes, definir territórios diferenciados e projetar experiências que gerem valor e preferência no consumidor.
Inovação orientada para o consumo: novas utilizações, novos momentos, novos contextos
A inovação consolidou-se como uma das principais alavancas estratégicas para o crescimento do setor hortofrutícola. No entanto, o seu alcance já não se limita à melhoria varietal ou à eficiência produtiva: o verdadeiro valor emerge quando a inovação se orienta para criar novos usos, novos momentos e novos contextos de consumo. O desafio do setor não reside apenas em produzir mais ou melhor, mas em repensar como, quando e porquê as frutas e hortaliças são consumidas, transformando a inovação numa ferramenta de expansão da categoria.
Esta edição mostrou como o setor começa a evoluir de uma lógica puramente produtiva para uma inovação orientada para o mercado, onde o desenvolvimento de variedades e a adaptação aos hábitos do consumidor convergem para redefinir a experiência dos produtos frescos.
Neste sentido, a Rijk Zwaan destacou-se novamente em investigação e desenvolvimento, apresentando uma proposta que ilustra esta convergência entre tecnologia, conveniência e experiência. As suas novas variedades – como o melão amarelo “Tropical Honey” e o melão laranja “Orange Sunglow” – não só respondem à procura de diferenciação visual e sabor mais doce, mas também foram apresentadas com sugestões de consumo pensadas para novos contextos: porções individuais, combinações com outros alimentos e apresentações adaptadas ao consumo informal ou partilhado. No seu stand, estas variedades eram exibidas como produtos prontos a desfrutar, não apenas como fruta fresca, mas como parte de um novo imaginário gastronómico: o snack saudável, a sobremesa alternativa ou a opção refrescante para qualquer momento do dia.
A inovação varietal também foi complementada com desenvolvimentos, como as variedades de folhas de alta densidade “Teen Leaf”, projetadas para a IV gama: criadas para a colheita mecanizada e longa vida útil, respondem tanto às necessidades industriais quanto ao desejo do consumidor de ter acesso a produtos frescos em formatos práticos e prontos para consumo. Assim, a genética e a conveniência são articuladas como duas dimensões da mesma estratégia: a de expandir a categoria através da adaptação aos novos ritmos e estilos de vida.
A embalagem assume aqui um papel fundamental na criação de novos contextos e momentos de consumo. A tendência para embalagens transparentes, práticas e visualmente atrativas permite comunicar frescura e confiança, mas também facilita novas ocasiões de consumo “on-the-go” ou em formato snack, incorporando frutas e legumes em momentos antes dominados por categorias como bebidas, laticínios ou confeitaria. Exemplos como os mini pepinos “MyCubies”, a “Alface Snack” ou os arandos da Fruitist demonstram como a embalagem se torna um facilitador de novas rotinas de consumo, mais espontâneas, móveis e associadas ao prazer.
Em paralelo, a expansão da quinta gama confirma esta mesma lógica: integrar o fresco em contextos de conveniência e experiência. Propostas como a da Diquesí, que leva o universo dos frescos ao terreno do street food com produtos como o brioche com carne de porco em tacos ou o pão bao com carne desfiada, mostram que a inovação também passa por reinterpretar os limites da categoria, aproximando o produto hortofrutícola de novos territórios gastronómicos e ready-to-eat.
Em conjunto, estas iniciativas apontam para uma direção clara: o crescimento do setor dependerá da sua capacidade de ligar a inovação técnica à criação de novos usos e momentos de consumo. As empresas que encarem o produto não apenas como um resultado agronómico, mas como um veículo de experiências, serão as que conseguirão transformar a fruta e os legumes em categorias dinâmicas, relevantes e plenamente integradas na vida quotidiana do consumidor.
Da responsabilidade ao retorno: quando a sustentabilidade permite novos modelos de negócio
A sustentabilidade deixou de ser um argumento genérico para se tornar um elemento mensurável, gerível e estrategicamente relevante. Cada vez mais, as empresas traduzem os seus compromissos ambientais em modelos de gestão de impacto tangível, que combinam eficiência operacional, colaboração e geração de novas oportunidades de valor.
No setor hortofrutícola, esta evolução também está a transformar a forma como as empresas compreendem e gerem o seu negócio. A sustentabilidade já não é percebida como uma obrigação ou uma ferramenta de reputação, mas sim como uma alavanca estratégica capaz de impulsionar a inovação, a diversificação e novas formas de crescimento partilhado. Ao integrar-se na estrutura operacional e económica das organizações, permite modelos de negócio mais abertos, baseados na rastreabilidade, na transparência e numa ligação mais direta e significativa com o consumidor.
Um exemplo desta mudança é representado pela Cool Farms, com a iniciativa “CoolEarthCoin (CEC)”, um modelo que monetiza a redução de emissões resultantes da agricultura regenerativa e liga diretamente o consumo à ação climática. Desta forma, a empresa não apenas mensura a sua contribuição ambiental, mas também ativa um novo modelo relacional, onde produtores, marcas e consumidores participam em conjunto na criação de valor ambiental e económico.
Através de propostas como esta, a sustentabilidade deixa de ser um argumento comunicativo para se consolidar como uma plataforma de transformação empresarial, um enquadramento a partir do qual as empresas podem repensar o seu papel no mercado, desenvolver novas propostas de valor e estabelecer as bases para a sua competitividade futura.
A Fruit Attraction 2025 evidencia uma transformação estrutural do setor hortofrutícola. A competição já não é definida apenas pela qualidade do produto, mas pela capacidade das empresas de criar valor para além do agronómico. O setor está gradualmente a integrar-se nas dinâmicas do grande consumo, o que exige uma gestão mais estratégica, baseada na construção da marca, na inovação orientada para o mercado e na sustentabilidade como vetor de competitividade.
O crescimento futuro dependerá da capacidade do setor de transcender a lógica produtiva e operar sob modelos centrados no consumidor e na criação de valor sustentável. A inovação deixa de ser incremental e passa a estruturar novas ocasiões de consumo; a marca torna-se um ativo diferenciador; e a sustentabilidade, uma plataforma para desenvolver modelos de negócio mais eficientes, rastreáveis e colaborativos.
Em conjunto, o setor avança para um cenário em que a vantagem competitiva é construída a partir da gestão integrada de valor. As empresas que conseguirem redefinir a sua proposta e evoluir de produtores para gestores de categorias e experiências serão as que consolidarão posições de liderança na próxima etapa do setor hortofrutícola.
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